quarta-feira, março 31, 2010

Lhama

No inicio de tudo, quando ainda nem sonhávamos com o que iríamos ser nem com o que não seríamos, preenchíamos nosso tempo com sonhos e histórias sobre vestibulares seriados, bandas de garagem e outras fora delas, e toda sorte de amenidades que moram ali nos dezesseis ou dezessete anos.

Da escola, absorvíamos pouco, mais pela repetição e pela insistência ali, 8 horas de dedicação para depois merecer uma cerveja num bar duvidoso, ou umas voltas de Fiat Uno verde ao som de um grunge qualquer. Grunge qualquer não, aquele fita no carro fora gravada por um grande amigo.

Eu e Hurt nos conhecemos no segundo ano do ensino médio, durante uma viagem de ônibus para uma etapa de um vestibular. Dividimos um toca CD's suspeitíssimo. Falar sobre isso é no mínimo arriscado, pois ele, mais que qualquer outra pessoa memoriada do mundo, coleciona tudo, inculsive memórias, compulsivamente. Mas vou me arriscar aqui inventando as minhas e com a minha medida.

Hurt tornou-se uma espécie de irmão mais novo que observava atento as articulações de um outro carinha mais velho, com algumas histórias impressionantes para contar. Ao fabular para ele alguma história, normalmente sobre novas conquistas ou outras aventuras juvenis, via que Hurt apreendia aquilo, vibrava com um pescador e seu novo peixe grande.

Entretanto, ele não era só um espectador atento, era comigo autor daquela história feita sob encomenda para nós nos divertimos e reinventarmos nosso dias. Éramos uma dupla.

Hurt foi para a faculdade de comunicação, e eu que quisera ser médico um dia, me juntei a ele dois ou três anos depois na mesma faculdade e no mesmo curso. Típico evento, já que ele sempre foi afeito a mais constâncias e paciências que eu. Falei medicina e fiz comunicação. Se falasse comunicação, agora deveria estar em algum bloco cirúrgico ou enfiado num consultório branco. Enfim, nesse período da universidade forjamos uma reedição daquele tempo só que aos vinte e poucos anos, mas aquele sistema de antes, do irmão mais novo, ainda perdurava.

Eu sinceramente, com toda prepotência que podia ter e tinha, achava que me arriscava mais, que me divertia mais, namorava mais e que vivia mais. Não sei ao certo se era isso que eu fazia naquele tempo, mas as atribulações as que me envolvia me sinalizavam que eu vivia. Meu corpo me dava dicas disso aos poucos e eu me preocupava com Hurt pelo fato de ele não se perder no arriscatudo.

O que quero dizer depois disso tudo dito, é que hoje temos quase 30, uma calva parecida e mantemos algumas piadas internas antigas. Eu estou no mesmo lugar. Hurt não está. Hoje sou o irmão mais novo. O tempo não controla.